Faz muitos anos que eu ouvi falar pela primeira vez no nome Harry Potter, que pertence a um menino que era baixinho e ingênuo e que agora é pai de família e tudo mais, depois de passar por alguns acontecimentos bem desagradáveis. Naquela época eu ainda era adolescente e, assistindo os filmes, não tive conhecimento da sua origem nos livros da escritora britânica J.K. Rowling, senhora esta que escreveu a saga do garoto Potter, finalizada em 2007, e que podemos dizer que foi responsável pelo seu reconhecimento mundial dentro do cenário literário. Anos depois, eis que Rowling decide escrever um romance para adultos, não relacionado ao universo HP, o que certamente atraiu alguns olhares de curiosidade e muitos outros de dúvida sobre o que poderia sair de tal experimento. Disso nasceu Morte Súbita, livro que estou trazendo hoje para vocês, e que mostra não somente uma história que pode ou não ser interessante mas principalmente uma J.K. Rowling absolutamente diferente, sem varinhas e vassouras.
Uma das características mais
marcantes de Morte Súbita para
aqueles que vieram de leituras anteriores de Harry Potter é a linguagem
utilizada pela autora, que não tem nada de juvenil e traz uma expressão de
realidade muito crua, fazendo jus à sua proposta de ser um romance para
adultos. Ainda que leitores novos de Rowling não o percebam, isso com certeza
será algo notável logo de cara para o pessoal mais old-school, e também serve
como janela para comentar a habilidade da escritora em se aventurar em um tipo
de narrativa totalmente diferente sem deixar a desejar. O texto é muito rico,
traz boas descrições de elementos que ela precisou utilizar para sustentar a
história e, apesar de a primeira metade ser um pouco “arrastada”, se o leitor
for persistente a leitura irá se tornar mais excitante a partir da segunda
metade.
J.K.
Rowling define Morte Súbita como uma “grande história sobre uma cidade
pequena”. Assim são as grandes e boas histórias. Elas nos envolvem com
personagens que vivem, por exemplo, nos limites de um pequeno vilarejo. Sem que
possamos perceber, J.K. Rowling vai nos envolvendo com a história da cidade de
Pagford e nos mostrando que ela nos reserva muitas e grandes surpresas.
Falando sobre o enredo em
si, a autora entrou para o ramo da literatura adulta sem ficar para trás e
oferece cenas muito interessantes nesse tipo de contexto; situações onde rola
sexo e uso de drogas (destaque para as personagens Terri e Krystal), diferentes
tipos de abuso, muitas deficiências que existem na sociedade e que costumam
ficar longe dos olhos da mídia e da população em geral, jogos de poder político
etc., instrumentos que foram utilizados na construção da narrativa e muito
explorados durante a história. De modo geral, o texto flui bem e atende a
maioria das exigências de um leitor mais criterioso; ele tem conteúdo e
funciona.
É válido apontar um destaque
para a personagem Sukhvinder, que Rowling utilizou como canal para expor
problemas relacionados ao bullying e à exclusão social (link que a autora
também faz em Harry Potter) que existem em muitos lugares e muitas vezes são
ignorados pelas pessoas com quem o portador convive, justamente o que ocorre
com a garota. Seu desenvolvimento com a personagem é muito interessante e
guarda surpresas e descobertas que com certeza valem a leitura das 500 páginas
do livro.
Esse destaque também pode
ser expandido para os outros personagens diretamente ligados à trama, que de
maneiras diferentes também ganharam um aprofundamento bacana no que diz
respeito às suas histórias particulares. O grande trunfo do livro está no fato
de que o eixo da trama é a ausência do protagonista, Barry Fairbrother, que
morre na primeira página, e a sequência de eventos desencadeados por sua
partida, ligando todos os personagens a um emaranhado que converge cada vez
mais para um possível colapso iminente, o que é possível devido ao fato de
todos conviverem em uma cidade muito pequena. A empatia é algo que se manifeste
muito no texto, contagiando o leitor de cara.
Num
primeiro momento, Pagford nos parece apenas uma cidade, como outra qualquer,
mas ela pode ser comparada ao nosso bairro, ou à cidade de cada um de nós.
Pagford é o nosso mundo urbano, repleto de contradições e violências, e ainda
perplexo com o poder e as armadilhas da internet. Nos reconhecemos em Pagford,
em seus conflitos e no seu dia a dia. No entanto, naquela pequena cidade, a
morte súbita de Barry Fairbrother estava no cobiçado lugar da primeira peça,
aquela que não podia tombar. J.K. Rowling constrói um personagem principal
ausente, movimentando a trama exatamente por não estar mais lá.
A inovação de J.K. aparece
muito na sua idéia de gerir o texto a partir de um protagonista inexistente,
escrevendo a história a partir do rastro que ele deixou e da influência que
exerce de diferentes maneiras para cada personagem. Morte Súbita é um livro sem nenhum tipo de magia, mas que no
entanto tem seu próprio valor diferencial apostando em outros elementos que o
sustentam. Ainda que o início da leitura possa parecer ao leitor um pouco
cansativa e sem perspectiva de melhora, há uma recompensa confortável que o aguarda
nas próximas páginas enquanto a trama se desenrola.
Morte
Súbita é o primeiro romance de J.K. Rowling para adultos, e ele vem cercado de
mistérios, intrigas, suspense e grandes revelações. A autora nos mostra, página
a página, que as pessoas tem muitos, muitos segredos, e que todas elas reunidas
são capazes de multiplicar e fazê-los explodir. E a mais encantadora das
revelações é a confirmação do talento raro de J.K., que nos faz passar por mais
de 500 páginas num só fôlego, aflitos para saber o que acontecerá com cada um
dos seus personagens.
Indico a obra para leitores
de todos os tipos, ressaltando que ela trabalha com questões sociais de uma
maneira bastante atraente, fácil e que capta o leitor nos pequenos detalhes.
Particularmente, achei o livro interessante, ainda que levemente pedante em
algumas partes. Rowling teve um bom desempenho escrevendo sobre o mundo adulto,
e aqui fica o seu mérito por isso. Morte
Súbita é a minha recomendação dessa semana, seja você ou não um aluno de
Hogwarts.
Título: Morte Súbita (The Casual Vacancy)
Autor: J.K. Rowling
Pág.: 512
País: Reino Unido
Ano: 2012
J. K. Rowling é a autora dos
sete livros que compõem a série Harry Potter, publicada entre 1997 e 2007 e que
já ultrapassou a marca de 450 milhões de exemplares vendidos em mais de 200
países. Certamente, J.K. Rowling é a autora mais lida do mundo, tendo sido
traduzida para 73 línguas e adaptada para os cinemas em oito longas-metragens
de grande sucesso.
Além da Ordem do Império
Britânico por serviços prestados à literatura infantil, J.K. Rowling já recebeu
diversos prêmios e honrarias, incluindo o Prêmio Príncipe das Áustrias para a
Concórdia, a Legião de Honra da França e o Prêmio de Literatura Hans Christian
Andersen, e foi convidada a discursar na Universidade de Harvard, uma das mais
relevantes dos Estados Unidos.
Ela apóia um grande número
de causas beneficentes e é a fundadora da Lumos, uma instituição que trabalha
para transformar a vida de crianças carentes no mundo todo.
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